terça-feira, 14 de agosto de 2012

Excessos da meia idade


Psicóloga fala sobre a polêmica questão do abuso do álcool e drogas depois dos 50
O uso de bebidas alcoólicas faz parte da nossa cultura e não é, necessariamente, um problema. Cerca de metade da população brasileira consome bebidas com alguma regularidade, enquanto que a taxa de alcoolismo está por volta de 10% ou menos entre os homens, sendo menor entre as mulheres. Entre as pessoas acima de 50 anos, um beber moderado, equivalente a uma taça de vinho nas refeições ou o chopinho esporádico com os amigos, sem excessos ou embriaguez, está relacionado a uma vida social ativa e satisfatória, melhora do humor, redução do estresse e pode estar associado a uma menor taxa de doenças cardíacas, osteoporose, diabetes e perdas cognitivas.

Por outro lado, nesta faixa etária podem surgir diversos problemas de saúde relacionados ao uso abusivo. É comum que, durante uma internação hospitalar, pessoas que vem bebendo diariamente há muitos anos, ainda que não considerem seu consumo problemático, apresentem sintomas de abstinência ao álcool, pois o alcoolismo é uma doença que se instala muito lentamente. Com a idade podem surgir sintomas de doenças relacionadas ao uso crônico e prolongado de bebidas como, por exemplo, doenças do fígado, pâncreas, cardíacas, depressão e outros transtornos psiquiátricos. Esses são sinais de que é preciso buscar tratamento não apenas para a consequência, mas para a causa, o abuso de bebidas.

Em geral, o consumo de álcool tende a diminuir com a idade, mas algumas pessoas podem começar a beber ou aumentar a quantidade e frequência do consumo após os 50 anos, depois uma vida de abstinência ou moderação. Isto pode representar uma atitude positiva, como a busca por mais atividade social, mas é preciso estar atento: as mudanças pelas quais o corpo passa com a maturidade, com a diminuição da massa muscular e aumento da proporção de gordura corporal, afetam a capacidade de metabolizar o álcool. O abuso de álcool, principalmente quando associado a outras medicações frequentemente prescritas aos idosos, pode aumentar o risco de quedas e fraturas. No caso das mulheres esses riscos são potencializados pelas mudanças que ocorrem com a menopausa.

Entre os fatores que podem levar ao abuso de bebidas estão a depressão e ansiedade associadas ao medo do envelhecimento e perdas decorrentes da idade como viuvez, morte de amigos e parentes, aposentadoria, solidão, afastamento dos filhos, diminuição da vida social e sexual. Esses fatores não podem ser considerados "normais", mas identificados e tratados o quanto antes. Uma vida plena e de boa qualidade é a melhor prevenção para o alcoolismo e doenças associadas.

Outra questão relevante na terceira idade é o abuso de drogas de prescrição como analgésicos, ansiolíticos e remédios para dormir. Embora pareçam inocentes, até por terem prescrição do médico, têm alto potencial de abuso e consequente dependência. Fatores como dor crônica, depressão e ansiedade também podem estar por trás da procura por esses medicamentos e a prevenção do uso abusivo e dependência precisa estar focada para a identificação e tratamento das suas causas.

Embora o uso de substâncias ilícitas como maconha e cocaína ainda esteja associado, principalmente, aos mais jovens, à medida que as gerações que viveram a juventude nos anos 60 e 70, em que teve início um "boom" no uso dessas drogas, vão envelhecendo, torna-se necessário uma atenção diferenciada para essa questão. Ainda há pouquíssimos estudos sobre o tema, dificultados também pela ilegalidade dessas drogas que leva as pessoas a esconderem seu uso e evitarem falar sobre o assunto. Se alguns propõem o uso da maconha medicinal como alternativa de tratamento para algumas doenças relacionadas à idade, há suspeita que seu abuso possa contribuir para o isolamento do idoso e estar relacionado a um maior risco de quedas. No caso da cocaína, está comprovado que seu uso frequente acelera o envelhecimento cerebral e pode estar relacionado a um maior risco de demência, motivo suficiente para evitar o seu uso em qualquer idade.

Assim, para todos os casos vale a premissa de que o mais importante num processo de envelhecimento saudável é a busca por uma vida plena, rica em estímulos e experiências, com boa alimentação, atividade física e convívio social e o abuso de drogas, sejam elas lícitas ou ilícitas, não tem como fazer parte desse estilo de vida.

*Dra. Marilia Castello Branco (Psicóloga e escritora. Psicóloga dos setores de adolescentes  e mulheres do Proad - Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP).

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